terça-feira, novembro 28, 2006

À SUBURBANA

DOR. Penso que estou um pouco como tu. Sem saber muito bem o que dizer, pensar, o que fazer perante factos que nos ultrapassam e em que nos sentimos realmente impotentes para reagir. Hoje leio o meu post anterior e considero-o meio criançola. Se calhar vai acontecer o mesmo com este daqui a uns dias. Mas apeteceu-me desabafar e aquilo foi o que saiu. Não me arrependo. E sei que estes tristes acontecimentos nada têm a ver com Deus. Mas nestas alturas choca-me sempre haver quem a acredite que se foi para um sítio melhor. É um argumento que me remexe as entranhas.

A perda de duas pessoas de um momento para o outro numa redacção é um golpe duro. Estamos a viver um pesadelo. Mas estamos a viver. O César, o André, a Maria João e a Cláudia não têm essa sorte. E isso sim é algo que devemos agradecer. Não a um qualquer pseudo-deus todo-poderoso. A nós próprios. E tentar aproveitar todos os momentos para ser felizes. A vida é demasiado preciosa para deixarmos que ela se nos escape entre os dedos. A única coisa em que gosto de pensar no meio de tudo isto é que eles desapareceram na busca de um sonho.

Há relações difíceis de explicar. E de que não nos apercebemos no dia-a-dia. Era amigo do César e o André apenas conhecia de vista. Ao César conhecia-o há 11 anos, desde que ele chegou ao Record, e mais do que as suas capacidades profissionais, que eram muitas, gostava da sua cultura e apreciava sobremaneira a sua saudável loucura por cinema e banda desenhada. Era algo que partilhávamos todas as semanas, tanto pela discussão como pela troca de livros e filmes. O César iniciou-me no mundo do desenho norte-americano e eu puxava-o mais para o mercado francês e belga. No cinema éramos mais parecidos, tanto na apreciação dos clássicos como dos irreverentes Tarantinos e quejandos.

Curiosamente, choca-me mais o que sinto perante o desaparecimento do André. É um jovem que trabalhou ao meu lado durante 4 anos mas como um ilustre desconhecido. Provavelmente por já sermos de gerações diferentes e por ter entrado como estagiário quando eu era chefe de redacção. Mas era trabalhador, responsável e sabia responder quando questionado. Ou seja, era alguém de quem quase não sabia nada mas que me habituei a encarar todos os dias. O Record/online é a 10 metros do sítio onde me sento todos os dias. Eu via-o todos os dias.

Estranhamente, em Milão fartei-me de falar dele. Viajei com uma grande amiga e quis saber como ele era. Ela contou-me. Hoje tenho pena de não ter sabido mais. É sempre assim, não é? Temos a tendência para dar mais valor às coisas quando elas desaparecem. Estúpidos.

Costuma dizer-se que mau é para os que cá ficam. Não é verdade. Nós vamos continuar a viver. Mal ou bem vamos ultrapassar este choque. A família mais chegada provavelmente não. Eles não o poderão fazer. Eram demasiado jovens para morrer. Tinham muito para viver. Não percebo.

3 comentários:

Anónimo disse...

deixas-me sem palavras... força

Suburbana disse...

Obrigado pelo Post. No DN também se vive um pesadelo. A Zé era discreta, mas tinha sempre um sorriso nos lábios até para quem não conhecia. Como trabalhava na Sociedade até este Verão apenas tínhamos partilhado um trabalho que eu fiz para a secção. Mas este Verão ela foi uma das nossas repórteres que percorreu o país de norte a sul em reportagem para a Boa Vida. Curiosamente, na altura em que ela esteve em reportagem a minha editora estava de férias e fui eu quem assumiu durante 3 semanas a edição dos textos dela. Isso implicou um contacto diário permanente e naturalmente aproximou-nos como seres humanos.
Por coincidência, numa das nossas saídas da redacção para fumar um cigarro, compartilhei com outros colegas a sua alegria: estava de partida para a Patagónia. E nunca mais voltou...

Anónimo disse...

Cheguei a Portugal e a primeira noticia que li foi a tragédia que falas...lembrei-me que conhecia alguém de lá...tu...é de lamentar...à familia e amigos os meuus sentimentos!